segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

por não estarem distraídos

acervo pessoal da família

Havia a levíssima embriaguez de andarem juntos, a alegria como quando se sente a garganta um pouco seca e se vê que por admiração se estava de boca entreaberta: eles respiravam de antemão o ar que estava à frente, e ter esta sede era a própria água deles. Andavam por ruas e ruas falando e rindo, falavam e riam para dar matéria peso à levíssima embriaguez que era a alegria da sede deles. Por causa de carros e pessoas, às vezes eles se tocavam, e ao toque - a sede é a graça, mas as águas são uma beleza de escuras - e ao toque brilhava o brilho da água deles, a boca ficando um pouco mais seca de admiração. Como eles admiravam estarem juntos! Até que tudo se transformou em não. Tudo se transformou em não quando eles quiseram essa mesma alegria deles. Então a grande dança dos erros. O cerimonial das palavras desacertadas. Ele procurava e não via, ela não via que ele não vira, ela que, estava ali, no entanto. No entanto ele que estava ali. Tudo errou, e havia a grande poeira das ruas, e quanto mais erravam, mais com aspereza queriam, sem um sorriso. Tudo só porque tinham prestado atenção, só porque não estavam bastante distraídos. Só porque, de súbito exigentes e duros, quiseram ter o que já tinham. Tudo porque quiseram dar um nome; porque quiseram ser, eles que eram. Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios. Tudo, tudo por não estarem mais distraídos.

in "Para não esquecer" - 5ª ed. - Siciliano - São Paulo, 1992

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Las Mujeres com la Dignidad Rebelde
Ejército Zapatista de Liberacion Nacional

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

sábado, 5 de dezembro de 2009

o mundo fica todo descabelado...

Exquisite Corpse drawing entitled The Lamp Smokes but the Nile Reeks (La lampe fume mais le Nil empeste) by André Breton, Thérèse Caen, Benjamin Péret, Yves Tanguy and Robert Rius c.1937

EU SUBLIME

UMA MANHÃ

Há gritos que não acabam mais
berros de terra agitada como um leque
desmantelado
por topeiras em conserva
por soluços de tábuas que alguém estripa
longos como uma locomotiva que vai nascer
por convulsões de árvores revoltadas que não querem
deixar subir a seiva
tanto como o metrô não aceita transportar avestruzes
nos seus túneis de barba mal-escanhoada
há gritos
aranhas de vitríolo que engulo sem perceber
perto desse rio gasto saído de um bocal de cachimbo
que não passa de um longo focinho
um pouco quente
um pouco mais resmungão que um caldeirão quase
vazio
este no que tu não vês como não vês a poeira de uma
hóstia
que o vento misturou
com a poeira do vigário semelhante ao sulfato de cobre
e à da igreja mais torta que um velho
saca-rolha
pois não estás mais aí do que não estou aí sem ti
e com isso o mundo fica todo descabelado.


PÉRET, Benjamin. Amor sublime: ensaio e poesia. Organização: Jean Puyade. Tradução: Sérgio Lima, Pierre Clemens. São Paulo: Brasiliense, 1985.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Mark Seliger

Johnny Depp, Madame Simon Residence, France, 2003

fetichefetichefetichefetichefetichefetichefetiche

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Roy Lichtenstein, 1923-1997

Artist' s Studio "The Dancer", 1974

Oil and synthetic polymer paint on canvas, 8' 1/8" x 10' 8 1/8" (244.3 x 325.5 cm)

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Dom quixote

Don Quijote, Salvador Dali, 1983

A vida é um moinho
É um sonho o caminho
É do Sancho, o Quixote
Chupando chiclete
O Sancho tem chance
E a chance é o chicote
É o vento e a morte
Mascando o Quixote
Chicote no Sancho
Moinho sem vinho
Não corra me puxe
Meu vinho meu crush
Que triste caminho
Sem Sancho ou Quixote
Sua chance em chicote
Sua vida na morte
Vem devagar
Dia há de chegar
E a vida há de parar
Para o Sancho descer
E os jornais todos a anunciar
Dulcinéia que vai se casar
Vê, vê que tudo mudou
Vê, o comércio fechou
Vê e o menino morreu
E os jornais todos a anunciar
Armadura e espada a rifar
Dom Quixote cantar na TV
Vai cantar pra subir

(Rita Lee/ Arnaldo Baptista)